PRJ alternativo dos credores e a relação de poder

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O PRJ alternativo dos credores convoca os advogados a se especializarem. A Lei 14.112/20 trouxe significativas mudanças no que diz respeito à recuperação judicial. Em vigor desde janeiro de 2021, destaca-se a possibilidade de apresentação pelos credores de um PRJ alternativo. Até então não temos notícia da apresentação de PRJ pelos credores em alguma recuperação judicial no país.

O objetivo desse texto é brevemente apontar para a aplicabilidade do novo instituto. Da mesma forma, convocar advogados especialistas a olharem para credores como potenciais clientes. Trata-se, na verdade, de um “novo” nicho da advocacia, pois para cada devedor existem múltiplos credores desassistidos nos processos de recuperação judicial. A atualização da LRF é, neste ponto, um chamado para a articulação de credores.

De plano, cabe localizar onde está inserida esta disposição. O parágrafo 4º-A do artigo 6º da LRF estabelece que o plano alternativo poderá ser apresentado caso o Plano de Recuperação Judicial da empresa não seja deliberado dentro do stay period, isto é, do prazo de 180 dias, prorrogáveis por igual período na forma do § 4º deste artigo, durante os quais permanecem suspensas todas as execuções ajuizadas contra a recuperanda, assim como restam proibidas constrições patrimoniais contra o devedor.

Como segunda hipótese de plano alternativo, está a rejeição do Plano de Recuperação Judicial da recuperanda em assembleia geral de credores, prevista no parágrafo 4º do artigo 56 da LRF. Em ambos os casos, o prazo para apresentação de plano alternativo pelos credores é de 30 dias. Nesta segunda hipótese, o prazo de 30 dias deverá ser aprovado por credores que representem mais da metade dos créditos presentes na AGC, como estabelece o parágrafo 5º do artigo 56.

Como bônus para o devedor, igualmente em ambos os casos, as suspensões e proibições de que tratam os incisos do caput do artigo 6º durante o stay period, perdurarão por mais 180 dias, na forma do inciso II do seu § 4º-A. Os requisitos para o plano alternativo dos credores ser colocado em votação está no rol taxativo do parágrafo 6º do artigo 56 da LRF. Não observado o disposto nos §§ 4º, 5º e 6º, a consequência é a mesma da rejeição do Plano de Recuperação Judicial que já conhecemos, ou seja, a convolação em falência, conforme o parágrafo 8º do artigo 56.

Um PRJ alternativo proposto pelos credores para o soerguimento do devedor cria um ambiente favorável a soluções mais criativas. Seria essa inovação um cavalo de Tróia inserido na Lei 11.101/05 na calada do ano de 2020 ou mera tentativa de ressuscitar o comitê de credores? Parece que não. Fato é que paralelamente à pandemia de coronavírus e seus estragos na atividade econômica, passou-se a discutir desde o início daquele ano a atualização da legislação que rege a recuperação de empresas. E, nessa linha, com a Lei 14.112/20, possibilitou-se que da reunião séria de credores pode sobrevir o futuro do devedor.

A possibilidade de proposta de um PRJ alternativo pelos credores nos parece que veio para equilibrar a relação de poder havida no processamento da recuperação judicial. É que antes não havia opção à apresentação de planos de recuperação judicial excessivamente agressivos pelo devedor, principalmente para os credores menos privilegiados que – embora geralmente representem a maior parte dos créditos – se viam sem alternativa. Isto é, ou aceitavam migalhas ou ficavam, em eventual falência, como as tropas de Napoleão Bonaparte no porto de Lisboa ao final de 1807 com a partida do Rei D. João VI e toda a corte portuguesa para o Brasil.

Com a atualização da LRF isso pode mudar. Pode é potência, ao passo que a concretização no mundo dos fatos é ato. Aqui é a velha discussão entre ser e dever ser no direito que preferimos chamar de ato e potência para diminuir o tom materialista. A estrutura da realidade é composta tanto por aquilo que pode ser quanto por aquilo que é de fato. A própria potência já é ato do legislador, mas o ato que opera uma mudança em concreto entre devedor e credores na recuperação judicial dependerá da ação prática do advogado ou especialista.

Eis aqui o chamado para que advogados empreendam esforços em utilizar esta ferramenta na efetiva recuperação de créditos e de empresas em crise quando for pertinente. Talvez, à primeira vista, aparente ser algo muito complexo, mas nos parece mais simples, ainda mais com as facilidades dos meios eletrônicos, do que parece a aplicabilidade do PRJ alternativo. Basta que se articulem credores interessados com uma equipe de especialistas capazes de dar voz e legitimidade aos seus interesses.

 

Texto escrito e revisado pelo advogado Bruno Manfro a partir das últimas decisões e notícias sobre recuperação judicial.

Aqui nesse vídeo o advogado Marcelo Andreatta fala mais sobre o Plano de Recuperação Judicial e seus aspectos fundamentais. Neste outro vídeo o sócio Marcelo Andreatta fala sobre o porquê de os credores, via de regra, perderem tanto em uma recuperação judicial.

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